O Brasil caiu de 36º para 80º no ranking mundial da fome desde 2014, mas o agronegócio bate recordes

Imagem: Shutterstock


PROGRESSISTAS POR UM BRASIL SOBERANO

Neste momento, mais da metade dos brasileiros estão em situação de insegurança alimentar, e a pandemia apenas agravou anos de queda na qualidade de vida

Neste momento, mais da metade dos brasileiros estão em situação de insegurança alimentar, e a pandemia apenas agravou anos de queda na qualidade de vida. Desde 2014, o Brasil caiu de 36º para 80º lugar no ranking internacional da fome. conforme mostra uma longa publicação do jornal alemão Deutsche Welle.

O repórter Edison Veiga lembra que o problema é mundial, mas no Brasil a situação é particularmente grave, com o aumento da pobreza e diminuição da comida no prato como um fenômeno que começou antes da pandemia.

Em 2021, um relatório indicou que 55,2% dos lares vivenciavam insegurança alimentar – um aumento de 54% em relação a 2018, quando esse percentual era de 36,7%. Ou seja: 116,8 milhões de brasileiros não têm acesso pleno e permanente a comida.

Um levantamento mostra que hoje 9% da população brasileira – 19,1 milhões de habitantes – vivenciam uma escala mais grave, quando não é possível fazer nenhuma refeição durante um dia ou mais.

São apontadas como causas do comprometimento do acesso aos alimentos o desemprego crescente, a precarização do trabalho, a baixa remuneração, a retirada de direitos sociais e o progressivo desmonte de políticas públicas, todos iniciados após o golpe 2016, quando os neoliberais destituíram uma presidente vinculada a um partido de luta por trabalhadores em benefício do chamado ‘mercado’.

Em 2013, no final do primeiro mandato de Dilma Rousseff, 77,1% dos lares brasileiros estavam em situação de segurança alimentar – um recorde da série histórica, mas em 2018, durante a transição do governo Temer para uma prévia do que seria o governo Bolsonaro, o percentual já havia caído para 63,3%. E a curva segue em movimento descendente.

A Reforma trabalhista piorou a empregabilidade e reduziu direitos sociais vinculados ao trabalho, gerando desemprego e precarização do trabalho com redução de renda; paralisia de políticas sociais relevantes para o país.

A extrema pobreza baseada em renda aumentou em todos os anos mais recentes devido à grande recessão brasileira, aumento de desigualdade de renda do trabalho e enxugamento de programas sociais, tipo Bolsa Familia. A pandemia é uma etapa nesse processo.

No primeito ano do governo Bolsonaro, 11% dos brasileiros viviam em situação de pobreza, com pouco mais de R$ 260 por mês. Este valor considera um salário mínimo dividido por 4,6 pessoas — o tamanho médio de famílias pobres brasileiras.

Em meados do segundo ano do governo Bolsonaro, ocorreu o “auge do auxílio emergencial”. Por conta da pandemia, essa pobreza extrema havia caído para 4,8% da população. No final do ano passado, ocorreu aumento para níveis superiores ao pré-pandemia: 13% dos brasileiros estão nesta situação de miséria.

A ONU (Organização das Nações Unidas) diz que a insegurança alimentar grave chegou a patamares perigosamente altos depois da pandemia de covid-19. Em torno de 45 milhões de pessoas estão passando fome em 43 países do mundo. Em 2019, eram 27 milhões. A entidade pede para que governos e sociedades civis se unam a fim de mitigar esse cenário, insistindo em uma meta antiga de que a fome seja erradicada do planeta até 2030.

O aumento da fome no Brasil ocorre em níveis mais intensos do que em outros países. Se 17% dos brasileiros declaravam não ter dinheiro para comprar comida em 2014, quando o Brasil saiu do chamado Mapa da Fome da ONU, o número atual é de 28%. O retorno do país ao rol da insegurança alimentar da ONU se deu em 2018, durante o governo Temer. Em 2014, o Brasil ocupava a 36ª posição em um ranking de insegurança alimentar com 145 países, e agora está na 80ª.

Enquanto a produção brasileira de alimentos aumenta, falta comida no prato do povo. Um contrassenso. A fome que voltou a infelicitar os brasileiros, a ponto de se tornar um problema de saúde publica, não é resultado da pandemia, mas de políticas deliberadas que inviabilizam a agricultura familiar e subordinam a produção do campo aos interesses do agronegócio. Enquanto o desemprego explodia e a fome atingia pouco mais de 19 milhões de pessoas, o PIB do agronegócio conheceu uma expansão recorde de 24,31% em 2020.

Não sofremos com falta de produção, mas com o abandono dos brasileiros. Não houve interesse por parte do governo em proteger os vulneráveis e combater a fome. O que ocorreu foi uma série de perdas de proteções dos trabalhadores e dos humildes. Desregulamentações, ausência de políticas e de planejamento, defasagem na cobertura do Bolsa Família. Isso, somado ao desemprego crescente e a diminuição da renda, trouxeram ao cenário atual. A solução para esse problema passa por um conjunto de medidas – políticas públicas que implicam em trabalho-renda-produção de alimentos-acesso aos alimentos.

O Auxílio Brasil, de Bolsonaro, ajuda como algo emergencial, mas é simplista demais porque complexifica as condicionalidades do Bolsa Família, anda para trás na focalização e estabilidade e tropeça nos efeitos de longo prazo. Tenta ser um novo auxílio emergencial e ao mesmo tempo mudar a estrutura de benefícios. Gera muita confusão. Pode funcionar eleitoralmente mas não leva em conta o tamanho nem o grau de pobreza da família. A política social perde foco e durabilidade e ganha oportunismo eleitoral.

Tanto o auxílio emergencial quanto o Auxílio Brasil foram importantes pela transferência de renda, que amenizou a grave situação de milhões de famílias, porém foram mal desenhados e não tiveram a amplitude necessária. O auxílio emergencial teve seu valor aumentado pelo Congresso, a contragosto do governo, teve curta duração e foi interrompido por não ter previsão orçamentária suficiente. O Auxílio Brasil pretende ser um programa sem o improviso do anterior, mas é igualmente mal desenhado, não pode ser considerado propriamente uma política social e não consegue disfarçar o propósito eleitoreiro ao substituir o programa exitoso, o Bolsa Família, por uma marca própria.

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