[Vídeo] Tuiutí 2019 homenageia Lula e seu legado no enredo disfarçado do bode vereador, eleito em 1992

Paraíso do Tuiuti divulgou o samba enredo 2019 ainda em meados de 2018, após a prisão de Lula (ouça no vídeo mais abaixo). O Samba busca as origens nordestinas para divulgar a história da história, bebe na água de Raquel de Queiroz e disfarça na letra e na sinopse a história de um baixinho, barbudo, nordestino, amado pelo povo e querido pelos intelectuais.

A letra muito bem escrita, em mais um belíssimo samba faz um paralelo entre o Bode Vereador, no conto O Quinze, em uma analogia direta a um presidente nordestino que foi condenado a ser amado pelo Brasil.

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Se não fala abertamente de Lula, há analogia direta, tanto na sinopse quanto na letra.

LULA E O POVO II

“Vocês que fazem parte dessa massa irão conhecer um mito de verdade: nordestino, barbudo, baixinho, de origem pobre, amado pelos humildes e por intelectuais, incomodou a elite e foi condenado a virar símbolo da identidade de um povo. Um herói da resistência!
Não posso provar, mas tenho total convicção da autenticidade de tudo o que a ele atribuíram…”

Ainda fala da liquidação do país, já na letra do samba enredo. No mesmo trecho, fala do retirante que deixou a fome e ao Deus dará, o nordestino sonhador. É o trecho que faz a ligação por analogia entre o Bode Vereador e o ex-presidente.

Vendeu-se o Brasil num palanque da praça / E ao homem serviu ferro, lodo e mordaça… Vendeu-se o Brasil do sertão até o mangue / E o homem servil verteu lágrimas de sangue
Do nada um Bode vindo lá do interior / Destino pobre, nordestino sonhador
Vazou da fome, retirante ao Deus dará

E continua, afirmando que o povo não precisa de doutor, também em analogia à discriminação que Lula sofreu por não ter diploma. Lembrando a frase dita ao assumir a presidência. “Eu que nunca tive diploma, recebo como meu primeiro diploma, o de presidente do Brasil” disse Lula, em 1º de janeiro de 2003.

Ora, meu patrão, vida de gado desse povo tão marcado / Não precisa de dotô
Quando clareou o resultado / Tava o bode ali sentado aclamado vencedor

A letra, além de tudo, traz grade crítica ao sistema político e à dominação das elites sobre os mais pobres. Assim como no conto, parece trazer a luz um futuro possível nas eleições deste ano, quando diz: “Nem berrar berrou, sequer assumiu, isso daqui é um pouquinho de Brasil”. Algo que pode realmente ocorrer esse ano, Lula levar a eleição e não assumir.

O povo deve esperar por mais um desfile emocionante e de um encontro do Brasil com ele mesmo. A história será contata pela ótica de Raquel de Queiroz, sob a luz da realidade dura de um país liquidado num golpe de estado. Será mais uma madrugada de lavar a alma e ter a certeza de como um professor de história faz falta no mundo mas, não na Tuiuti.

Escute o samba abaixo e leia a sinopse no final.

O SALVADOR DA PÁTRIA

Vocês que fazem parte dessa massa irão conhecer um mito de verdade: nordestino, barbudo, baixinho, de origem pobre, amado pelos humildes e por intelectuais, incomodou a elite e foi condenado a virar símbolo da identidade de um povo. Um herói da resistência!
Não posso provar, mas tenho total convicção da autenticidade de tudo o que a ele atribuíram…

Não se sabe muito bem de qual paragem veio aquele cabra, ou melhor, bode. Dizem que era retirante da grande seca no sertão cearense imortalizada pela escritora Rachel de Queiróz, em O Quinze. Naqueles tempos de República quase balzaquiana, o Governo interceptava as procissões de fugitivos da miséria. Com medo de uma invasão furiosa, devido à fome que consumia aqueles esquecidos teimosos em se fazerem lembrar, pastorava o povaréu num campo de concentração antes que chegassem até a cidade. Porém, como o sertanejo é, acima de tudo, um forte, quando viu a terra ardendo e sentiu a baforada do Zé Maria no cangote o bode bumbou até Fortaleza com a coragem e a cara.

Penou, mas chegou.

Sentiu a brisa fresca do litoral acariciar aquela carcaça sofrida, castigada. Deixou para trás o passado capiongo, quando foi comprado por José de Magalhães Porto, representante do industrial Delmiro Gouveia, correspondente da empresa britânica que comercializava couros, peles, sementes de algodão e borracha, a Rossbach Brazil Company, localizada na Rua Dragão do Mar, Praia do Peixe. Dali virou mascote com direito à liberdade de ir e vir que, aliás, era bem praticada. Apreciava o movimento de barcos e jangadas enquanto perambulava entre os pescadores e seguia o aroma dos tabuleiros das merendeiras, tanto que os populares da região logo se afeiçoaram ao bichim. Dizem até ter remoçado em sua nova vida à beira-mar.

Ao cair da tarde, arribava pra Praça do Ferreira sassaricar com os artistas e intelectuais, herdeiros da Padaria Espiritual, no Café Java. Os boêmios acreditavam ser o poeta Paulo Laranjeira, reencarnado depois que o cabrão reagiu ao ouvir uma composição feita pelo desencarnado em homenagem a sua decepção amorosa. Desde então, o bode caiu nos braços da boemia. Bebericava, pitava, serestava pelas ruas, vielas e mafuás, botando boneco noite a fora.

De tanto vai e vem passou a ser chamado de Ioiô.

E lá se ia o bode Ioiô bater seus cascos Belle Époque alencariana adentro, sem a menor cerimônia, entre as modas copiadas do estrangeiro pelas “pessoas de bem” da sociedade. Passeou de bonde elétrico, frequentou o Theatro José de Alencar, participou de saraus literários e até comeu a fita inaugural do Cine Moderno.

Sentiu as Mademoiselles espilicutes exalando um perfume de civilidade europeia quando saíam da Maison Art-Nouveau em direção ao Passeio Público. Doce aroma que era constantemente interrompido pelo peculiar cheirinho de certo bode que dava rabissaca pro Código de Conduta imposto que, dentre muitas medidas disciplinadoras, proibia animais soltos nas ruas. Um Dândi sertanejo tão incômodo como as camadas pobres e marginalizadas as quais o poder desejava esconder por debaixo dos tapetes chiques para não atrapalharem o savoir-vivre nas avenidas, confeitarias, jardins, clubes e salões. Assim, velhos hábitos considerados de gente subdesenvolvida deveriam ser substituídos por novos costumes, os bons modos. Tanto cidade quanto população careciam ser modificadas, remodeladas num choque de aformoseamento. Afinal, para a elite, as maravilhas do mundo moderno não harmonizavam com a matutice do povo.

Povo, aliás, que já era mamulengo nas mãos dos poderosos, há muito tempo. A política republicana havia herdado antigos sistemas coloniais que se consolidaram em influentes famílias tradicionais e no domínio dos coronéis latifundiários, pois a prática do “manda quem pode e obedece quem tem juízo” era um tiro certeiro. Cabia à população ser tratada como gado trazido em cabresto curto, quais as aves de rapina direcionavam para onde quisessem, e cativos em currais eleitorais para que ela mesma sustentasse o sistema que a prejudicava.

Com um cenário governamental mais parecido com um covil repleto de animais nocivos ao interesse público e a feérica intervenção de aculturamento, a insatisfação popular só crescia. Até que a resposta do povaréu veio em forma de protesto no mais inesperado momento: nas eleições. Ao abrir a urna eleitoral se ouviu o berro do povo escrito nos votos que elegeram o bode Ioiô para vereador na Câmara Municipal de Fortaleza. Um deboche com os poderosos. Molecagem porreta! Sem ter feito campanha um animal ruminante era eleito pelo povo como seu representante! E, de fato, há muito já era um símbolo da identificação sertaneja que a elite (ameaçada pelas cédulas de papel) queria suprimir.

Contam que o fuá já estava instalado quando os poderosos articularam um golpe para que o bode Ioiô sofresse um impedimento e não assumisse o cargo ao qual foi eleito legitimamente, em processo democrático. Porém, a justificativa jurídica de incompatibilidade de espécie não livrou os políticos daquele vexame retumbante e só alimentou o monstro: Ioiô saiu da vida pública para entrar na história.

O bode mitou. Até hoje seus admiradores o defendem como ícone de empoderamento popular, representatividade dos marginalizados. Segue comandando a revolução do inconformismo seja nas lembranças dos memorialistas, nos cordéis, nos livros, na sala de um museu ou pelos blocos carnavalescos. Ioiô é a imagem da resiliência de um povo que faz graça até da própria desgraça e, com esse jeitinho inigualável, nos revela o genuíno salvador da nossa pátria: o bom humor.


Considerada pela grande crítica como dona do melhor samba-enredo de 2018, a Paraíso do Tuiuti definiu antecipadamente a melodia que vai embalar a escola no ano que vem. A direção resolveu apostar novamente no samba encomendado, valorizando o retorno do trabalho conquistado na atualidade.

Batizado de “Salvador da Pátria”, a agremiação do bairro São Cristóvão,vai contar na Sapucaí a história de um bode que foi eleito vereador de Fortaleza, em 1992. O samba foi composto por Moacyr Luz, Claudio Russo, Dona Zezé, Jurandir e Aníbal. O clipe completo estará disponível na próxima semana e será exibido nas redes sociais da escola.

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