Planalto corre contra o tempo em busca de diálogo, mas Congresso já arma novas bombas contra Marina

O Presidente do Brasi, Luiz Inácio Lula da Silva, cumprimenta Marina Silva | Imagem de Cristiano Mariz/O Globo

Medida provisória de Lula que reestrutura o governo perde validade em menos de uma semana

O governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi massacrado na votação do relatório do deputado Isnaldo Bulhões sobre a MP que reestruturou os ministérios, mas prepara algumas reações e uma delas foi explicitada pelo ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Alexandre Padilha, com o anúncio de que o chefe do Executivo vetará o trecho em que foram afrouxados os controles para se evitar desmatamento da Mata Atlântica, escreveu o jornalista Lauro Jardim, no ‘Globo‘.

Além do veto, o Planalto estuda também outras formas de contornar as derrotas, como o CAR (Cadastro Ambiental Rural), que deixará o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e irá para o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, sob a administração da economista, professora e escritora Esther Dweck, que usará a ferramenta para obrigar que os proprietários rurais cumpram o Código Florestal, cuja base de dados passa a ficar fora do controle de Marina Silva.

Uma das alternativas imaginadas pelo governo é que, por meio de um decreto ou portaria, que mantenha a responsabilidade sobre o cadastro no ministério comandado por Dweck, como decidiram os parlamentares, mas que a execução dessa função seja tocada pela pasta comandada por Marina, mas pode não ser tão simples assim, pois parlamentares importantes que tiveram a informação dessa possibilidade prometeram reagir se esse drible de fato acontecer.

Agora, após o aval ao acordo que esvaziou os ministérios de Marina e de Sônia Guajajara, o dos Povos Indígenas, os auxiliares escalados por Lula para tratar do tema anunciaram que buscarão reabrir o debate com o Congresso e tentar reverter mudanças feitas na medida provisória que reorganizou a Esplanada, escrevem Alice Cravo, Camila Turtelli e Lauriberto Pompeu, também no mesmo jornal.

Os jornalistas argumentam que, com base frágil, o tempo joga contra o Palácio do Planalto, pois a MP precisa ser apreciada até a semana que vem, sob pena de voltar a vigorar a estrutura deixada por Jair Bolsonaro a partir de 1º de junho. E caminhando no sentido oposto, o Parlamento já planeja novas derrotas à agenda liderada por Marina.

Já como uma porta de saída, no mesmo discurso em que defenderam diálogo com o Congresso, os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais) também pontuaram que as mudanças feitas pelos parlamentares não impedem a implementação do programa de governo.

Lula convocou Marina, Padilha, Costa, a ministra Sonia Guajajara (Povos Indígenas) e líderes no Congresso após a aprovação, em comissão mista, do relatório apresentado pelo deputado governista Isnaldo Bulhões (MDB-AL). O texto retirou do Meio Ambiente o controle do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e da Agência Nacional de Águas (ANA). A demarcação de terras indígenas foi deslocada da pasta de Guajajara para o Ministério da Justiça, de Flávio Dino.

De acordo com a colunista Vera Magalhães, Marina disse a portas fechadas que as políticas ambientais foram atacadas pelo Congresso, mas que ficará no cargo. Também durante a reunião, o Planalto deixou claro que a prioridade é evitar que o texto piore. Uma ala da Câmara planeja uma mudança que permitiria que licenças ambientais fossem emitidas por estruturas além do Ibama, como o Ministério de Minas e Energia, que está no centro de uma disputa com o órgão ambiental.

Uma possibilidade analisada internamente é que pastas que perderam funções tenham participação na definição de políticas públicas que foram redirecionadas para outros ministérios. O Planalto trabalha por uma gestão compartilhada, por exemplo, entre as pastas de Meio Ambiente e Integração na ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico). Relator da medida provisória e aliado do governo, Bulhões indicou que a margem de negociação com o Congresso é curtíssima: “As prerrogativas do nosso governo estão asseguradas. As mudanças apresentadas no texto estão em convergência com o governo“, reforçou.

Novos embates
A pressão do Congresso sobre Marina, cujo ministério tem pouco apoio político, na definição do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não se limitará às derrotas desta semana. Logo depois da votação do marco temporal das terras indígenas, prevista para terça, a bancada ruralista tem como uma prioridade um projeto que prevê indenização para proprietários cujas terras passaram a ser consideradas reservas indígenas. Outra é avançar com o texto que amplia o número de agrotóxicos que podem ser usados no país, apelidado de “PL do Veneno” por ambientalistas.

A proposta de indenização aos donos de terras já foi aprovada pelo Senado e está em análise na Câmara, onde é o próximo da lista da bancada próxima ao agronegócio. Assim como em outros temas que opõem ambientalistas e ruralistas, o projeto divide membros do governo. Uma ala vê a indenização como uma ferramenta para pacificar a questão da demarcação das terras indígenas. Por outro lado, o ministério de Sonia Guajajara resiste.

Já a proposta que amplia a quantidade de defensivos agrícolas está no Senado. Ainda que sob a relatoria do senador Fabiano Contarato (PT-ES), ruralistas acreditam que o texto pode avançar neste semestre. Na quarta-feira, o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, deve participar de uma audiência pública sobre o assunto.

Outro tema com potencial de desgaste para Marina, este fora do Congresso, é a renovação da licença da hidrelétrica de Belo Monte. Para interlocutores, como a usina já está em funcionamento, a ministra não vai se opor, mas a expectativa é de uma análise detalhada sobre os critérios técnicos. Em meio ao turbilhão, o deputado Nilto Tatto (PT-SP), presidente da Frente Parlamentar Ambientalista, diz sobre a ministra: “Não vejo abandono. Mas faltou uma articulação maior entre o Congresso e o Ministério do Meio Ambiente“.

Panos quentes
Em público, nesta sexta-feira, Rui Costa tentou passar o tom de unidade, pedido por Lula, e afirmou que o governo intensificará as conversas: “Vamos trabalhar no Congresso para que a essência das políticas públicas permaneça. Precisamos reafirmar a prerrogativa de quem ganhou a eleição“. Costa classificou como “inócua” a discussão sobre o CAR, cujo comando passou do Meio Ambiente para o Ministério da Gestão. O ministro ponderou que o acesso às informações acrescentadas pelos proprietários rurais seguirá aberto para os órgãos do governo.

Ele pontuou ainda que apenas a homologação das terras indígenas foi deslocada para a Justiça e que as fases anteriores do processo seguem no ministério de Guajajara. Padilha acrescentou que as conversas com o Congresso continuarão ocorrendo para que sejam feitos os “aprimoramentos necessários”: “Vamos dialogar até o último momento de votação, para que o texto final tenha o espírito da MP inicial“, disse Padilha, descartando uma ação no Supremo Tribunal Federal.

Veja as próximas batalhas do governo

Enfraquecimento do Ibama
Uma ala da Câmara articula apresentar uma emenda em plenário para incluir a possibilidade de licenças ambientais serem autorizadas por outros órgãos além do Ibama, como o Ministério de Minas e Energia. O texto será votado na semana que vem.

PL do Veneno
O projeto, que está no Senado, concentra a atribuição de autorizar o uso de agrotóxicos no Ministério da Agricultura, desde que com aval da Anvisa. Hoje a decisão é compartilhada com o Meio Ambiente. O texto também amplia a quantidade de defensivos permitidos. O texto está na Comissão de Meio Ambiente, e ruralistas pressionam pela votação.

Indenização
Uma PEC já aprovada pelo Senado e pela CCJ da Câmara prevê indenização para donos de terras que passaram a ser consideradas reservas indígenas. A proposta divide o governo. A bancada ruralista quer priorizar o tema após a votação do marco temporal das terras indígenas, que deve ocorrer na semana que vem.

PL da Grilagem
Também no Senado, o projeto amplia em quase dez anos o prazo para regularização de terras invadidas e facilita os procedimentos. O parecer favorável na Casa é de Carlos Fávaro, hoje ministro da Agricultura.

Licenciamento ambiental
Projeto em tramitação no Senado extingue a obrigatoriedade de licenciamento ambiental para mais de dez atividades que, na opinião do Meio Ambiente, são de risco elevado.

Belo Monte
Projeto em tramitação no Senado extingue a obrigatoriedade de licenciamento ambiental para mais de dez atividades que, na opinião do Meio Ambiente, são de risco elevado.

BR-319
A reconstrução da rodovia, que liga o Amazonas a Rondônia, é apoiada pelo ministro dos Transportes, Renan Filho, mas ambientalistas afirmam que as obras facilitam a atuação de grileiros e madeireiros. O Ibama estuda rever a licença. Na Câmara, Marina disse que o empreendimento é “complexo”.

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