Marcello Lavenère, o advogado que entregou o pedido de impeachment de Fernando Collor ao presidente da Câmara na época, Ibsen Pinheiro, avalia que o momento atual contra Dilma Rousseff não tem embasamento suficiente para alavancar sua saída do Governo.
No ano de 1992, Marcello Lavenère entregou o pedido que resultou na saída do então presidente da república Fernando Collor. Mas ele disse que o cenário atual é bem diferente do ocorrido naquele ano. E que os mais de dez pedidos de impeachment que Eduardo Cunha recebeu não terão fundamentação porque não há denúncias consistentes, nem comprovação do envolvimento direto de Dilma nos citados esquemas de corrupção.
O advogado ex-presidente da OAB está de acordo com os líderes do governo que acusam a oposição de uma tentativa de golpe que se iniciou antes de Dilma tomar posse, quando já se dizia que ela sofreria um impeachment. Já no caso de Fernando Collor, foi seu irmão quem o acusou diretamente de ser o chefe de um esquema nacional de corrupção numa acusação pública, direta e consistente contra o presidente do Brasil, muito diferente do que ocorre hoje, pois as acusações não são endereçadas à Rousseff, mas ao seu partido. Quanto ao dinheiro para a campanha de Dilma, Lavenère diz que foi o tesoureiro dela quem o recebeu e não a Presidente. Leia os principais pensamentos de Marcello Lavenère:
“Impeachment é um processo penal constitucional que não se procede quando da falta de prestígio, de governo fraco, de crise na economia, de dólar alto, de orçamento deficitário, o que não se resolvem nas instâncias políticas do parlamento. Além disso, há uma enorme quantidade de juristas respeitados que dizem não haver possibilidade jurídica ou técnica para impeachment. Novamente no caso de Collor, o Congresso fez uma CPMI para apurar se ele tinha envolvimento e, quando veio o relatório, concluiu-se pela necessidade de um processo de impeachment, o que foi apoiado por praticamente a totalidade das entidades da sociedade. Quem organizou? Ninguém. A orquestra tocou afinada sem maestro.
A oposição alega que o impeachment é um processo político, mas ter uma base parlamentar fraca não é motivo. Nem contas rejeitadas pelo TCU. Não está previsto na Constituição, assim como as contas da campanha rejeitadas. O processo de impeachment é um processo penal constitucional, não é político de oposição. Aplica uma pena e só pode ser aprovado se provar que o acusado cometeu algum dos crimes que estão previstos na Constituição. Por mais que a oposição pretenda desgastar o governo, e parece que é essa a intenção, nem mesmo eles parecem ter muita convicção de que esse processo vá adiante. Não tenho nenhuma vinculação política nem nada, mas vejo que o que acontece no nosso país atualmente é uma insatisfação de quem perdeu as eleições por pouco.
Em setembro, o governo obteve uma vitória no Congresso em que foram mantidos 26 vetos da presidente. Para isso, precisou ter maioria na Câmara, que é o corpo político que estaria contra o governo. Mas é uma evidência de que o governo não está assim tão enfraquecido, porque conseguiu manter esses vetos. Não vejo, no momento, clima político para o pedido de impeachment prosperar, porque o governo mantém sua base a trancos e barrancos, mas mantém. E existe uma preocupação de desestabilizar um governo legalmente eleito. Preocupação de invalidar o resultado das eleições. Eu acho que, neste caso, sim, significa uma tentativa de golpe. Já se falava em impeachment antes das eleições. Trinta dias depois, um partido político encomendou um parecer de um grande jurista de São Paulo de mentalidade muito conservadora. Essa articulação dos partidos de oposição, movidos pela insatisfação e pelo chororô de quem perdeu eleição, a mim tem cheiro de golpe, sim.
Quanto ao escândalo da Petrobras, qualquer partido que tenha dado motivos de ser investigado, deve ser investigado. Pode ser PT, PP ou PSDB. Se a presidente der motivos amanhã para que haja um impeachment contra ela, eu vou dizer que está provado que ela fez algo que justifica. O presidente da República em 1992 tinha uma base parlamentar, mas seu partido não era forte. O Collor foi eleito com base no prestígio pessoal dele, de caçador de marajás. O Congresso apoiava o presidente por ele ter sido eleito democraticamente e por tentar modernizar a economia brasileira. Os dois primeiros anos do Collor não foram de isolamento parlamentar. A situação começou a mudar quando começaram a surgir evidências em relação a ele. Não havia uma predisposição contra ele. Agora, no entanto, há uma predisposição de boa parte do Congresso contra Dilma, de, a qualquer título, arranjar um motivo para tirá-la.
Em se tratando das novas denúncias envolvendo Collor na operação lava-jato, confesso que não as esperava. Ele passou um tempo afastado da política e depois retornou em Alagoas, onde tem indiscutivelmente um prestígio grande. Não me surpreendeu porque sabemos que qualquer pessoa pode cometer um delito e ele já tinha cometido antes. Mas eu esperava que ele pudesse recuperar sua vida política sem reincidir. Mudanças na legislação são necessárias para combater a corrupção que se tornou crônica. A principal mudança é tirar o dinheiro das empresas das campanhas eleitorais. A sociedade brasileira não suporta mais isso. Os empresários também não suportam ter de dar dinheiro para um lado e depois para o outro, sendo achacados pelos candidatos.”