Após a Suprema Corte decidir que o princípio é inconstitucional, o Senado aprovou o projeto que determina o respeito ao marco temporal para definição de terras indígenas e texto vai à sanção do estadista
“Duas instituições, duas decisões. O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, por 9 votos a 2, a tese do marco temporal para demarcação das terras indígenas na semana passada, decidindo que ela é inconstitucional por ferir os direitos dos povos originários. Nesta quarta-feira, 27, foi a vez de o Senado Federal decidir o contrário“, escreveu o ‘Estadão’.
Por 43 votos a 21, o projeto que estabelece o marco como referência para definição das áreas foi aprovado, nesta quarta-feira (27/9), e agora vai à sanção do Presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem 15 dias para fazê-lo. Já o acórdão com a decisão do STF sobre o tema tem até 60 dias para ser publicado no DOU (Diário Oficial da União).
Mesmo sem a publicação do acórdão do STF e a sanção ou veto de Lula, a decisão da Suprema Corte deverá ser seguida na prática, já que é de conhecimento geral da Justiça brasileira que a tese foi declarada inconstitucional. Dificilmente um juiz quererá contrariar a decisão do Judiciário.
Caso Lula decida vetar a íntegra ou trechos do projeto de lei ou trechos do texto aprovado pelos parlamentares, o Congresso ainda pode derrubar o ato presidencial. Enquanto isso, processos de demarcação de terras indígenas e ações judiciais contestando demarcação de reservas podem entrar em compasso de espera.
Se a lei aprovada pelo Legislativo entrar em vigor, entidades civis e partidos políticos podem recorrer ao Supremo para tentar invalidar o projeto de lei, em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Na prática, significa que alguma representação irá “lembrar” o STF de que ele próprio decidiu que a tese do marco temporal fere o direito dos povos indígenas e foi declarada inconstitucional.
O Supremo pode, então, em caráter liminar, suspender a vigência da lei até que os ministros decidam se o novo texto do Congresso é ou não inconstitucional. Ou seja, o último a falar é o Supremo Tribunal Federal.
Randolfe diz que Lula vetará trechos
O líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues (sem partido-AM), disse que Lula deverá vetar trechos do projeto não relacionados à demarcação em si.
Entre eles, estão:
a retomada pela União de terras indígenas nos casos de alteração de traços culturais da comunidade para destiná-las para a Reforma Agrária;
a validação de propriedade ou posse de particulares em terras indígenas; a proibição do aumento das localidades já demarcadas;
a possibilidade de contratos de cooperação com não indígenas para a exploração de atividades econômicas;
e o contato com povos isolados.
O senador reforçou que independemente da decisão, o projeto é inconstitucional.
Lula tem uma posição política clara em defesa dos direitos povos originários.
“A matéria será vetada e nós lutaremos aqui pela manutenção do veto. O Congresso vai ter que conseguir maioria absoluta lá na Câmara e aqui no Senado para derrubar o veto. Eu acho que não tem esse quórum para derrubada do veto e mesmo que o veto presidencial seja derrubado, essa matéria é inconstitucional na lata, é flagrantemente inconstitucional“, afirmou, segundo a Agência Senado.
Os defensores do marco temporal admitem a retirada de alguns trechos, mas não aceitam o veto total ao projeto, como declarou a senadora Margareth Buzetti, do PSD de Mato Grosso.
Ela afirmou que nesse caso o Congresso Nacional derrubaria a decisão do presidente Lula.
“Têm alguns pontos que estão nesse texto que se a gente modificasse voltaria para a Câmara, então, não foi feito por isso. E é perfeitamente entendido se o presidente vetar. Por exemplo, querer tirar área já demarcadas para indígenas é passível de veto sim, a gente entenderia. Mas não o texto principal. O marco temporal tem que existir, tem que dar um fim, tem que dar um basta a essa situação“, disse Buzetti.
Os defensores dos direitos indígenas aguardam a sanção do projeto para novamente recorrerem ao Supremo Tribunal Federal para derrubar a nova lei apontando justamente o julgamento recente da Corte que considerou inconstitucional a tese do marco temporal.