O poema “José” de Carlos Drummond de Andrade foi publicado originalmente em 1942, na coletânea Poesias. Ilustra o sentimento de solidão e abandono do indivíduo na cidade grande, a sua falta de esperança e a sensação de que está perdido na vida, sem saber que caminho tomar.
E agora, Mané? é uma paródia de Roberto Ponciano sobre José, de Drummond, que também ilustra o sentimento de solidão e abandono do indivíduo, desta vez não somente na cidade grande, mas em todo o Brasil sob o bolsonarismo.
A falta de esperança e a sensação de que está perdido na vida, sem saber que caminho tomar também estão sob a mesma ótica de Carlos Drummond de Andrade. Perfeito!
Leia a paródia de Roberto Ponciano sobre o poema José, do Drummond. (Abaixo, postamos o original)
E agora, Mané?
E agora Mané? / E agora você?
O dólar subiu, / O salario despencou, / Sua renda caiu, /
Aposentadoria acabou, / E agora mané? / E agora você?
Você que é sem brio / Que zomba do pobre / Que gritava mito / E pensa que é elite / E agora você? /
Está sem mulher / Está sem emprego / Está sem dinheiro /
Já não pode comer carne / Já não pode beber / Já não grita mais fora PeTê! /
Teu mito te enganou / Viagem a Disney não veio / Teu sonho de elite não veio / O dólar ao par não veio / Teu dinheiro acabou /
A elite fugiu / Só você se estrepou / E agora mané? /
Sua tosca loucura / Seu discurso insano / Sua camisa da CBF /
Seu gesto de arminha / Seu nojo do povo / Seu salário tão curto /
Sua incoerência / Seu odio e agora? /
Com a arma na mão / Quer ser da elite / A elite te despreza /
Quer fugir do Brasil / Mas ninguém te quer lá / Que ir para Miami
Mas Trump não deixa. / Mané, e agora? /
Se você lutasse / Se você sofresse / Se você se tocasse /
Da luta de classe / Se você nos ouvisse / Se você entendesse /
Mas você não entende / Você é um DURO, Mané! /
Nos pôs neste escuro / Com o cão do fascismo / Sem uma esperança /
Sem alternativa / Para nos consolar / Sem jatinho branco /
Que fuja para Miami / Você marcha, Mané. / Mané, para onde?
Compare a paródia de Roberto Ponciano sobre o poema José, do Drummond.
José
E agora, José? /
A festa acabou, / a luz apagou, / o povo sumiu, / a noite esfriou, /
e agora, José? / e agora, você? /
você que é sem nome, / que zomba dos outros, / você que faz versos, /
que ama, protesta? / e agora, José? /
Está sem mulher, / está sem discurso, / está sem carinho, /
já não pode beber, / já não pode fumar, / cuspir já não pode, /
a noite esfriou, / o dia não veio, / o bonde não veio, / o riso não veio, /
não veio a utopia / e tudo acabou / e tudo fugiu / e tudo mofou,
e agora, José? /
E agora, José? /
Sua doce palavra, / seu instante de febre, / sua gula e jejum, /
sua biblioteca, / sua lavra de ouro, / seu terno de vidro,
sua incoerência, / seu ódio — e agora? /
Com a chave na mão / quer abrir a porta, / não existe porta; /
quer morrer no mar, / mas o mar secou; / quer ir para Minas, /
Minas não há mais. /
José, e agora? /
Se você gritasse, / se você gemesse, / se você tocasse /
a valsa vienense, / se você dormisse, / se você cansasse, /
se você morresse… / Mas você não morre, /
você é duro, José! /
Sozinho no escuro / qual bicho-do-mato, / sem teogonia, /
sem parede nua / para se encostar, / sem cavalo preto /
que fuja a galope, / você marcha, José!
José, para onde?
E agora, Mané?!…
João-Sem-Braço, ‘óminho’.