Operação Lava-Jato atirou para celas com água gelada, ratos e morcegos parte da elite financeira do Brasil habituada a mansões, jatos e iates
Às 06:00h do dia 19 de junho de 2015, Marcelo Odebrecht nadava furiosamente na sua piscina olímpica – privada, coberta e aquecida – quando tocaram à porta da mansão da família, avaliada em 2,5 milhões de euros, no bairro dos Jardins, em São Paulo. Como o batalhão de empregados ainda não tinha iniciado o serviço, foi o próprio empresário de toalha enrolada quem recebeu os agentes da polícia que o levariam para a cadeia.
O até àquele dia era o nono homem mais rico do Brasil, com fortuna pessoal de 3,5 bilhões de euros, partilhou desde então, com mais três executivos da sua construtora, uma cela minúscula na Custódia de Curitiba, sem janela e iluminada apenas pela luz do intervalo das grades, por quase dois anos. Dormiu num beliche, que lhe serviu de escritório, e, fanático pela forma física, usou um degrau para fazer step e o exíguo espaço disponível para abdominais e flexões, antes do banho, necessariamente gelado, no balneário coletivo.
Condenado a 19 anos e meio de prisão, viu o juiz Sérgio Moro bloquear-lhe sete milhões de euros no banco e apreender sete carros da frota familiar. Antes de ser transferido para regime de prisão domiciliar, Marcelo Odebrecht, contaram os guardas de Curitiba, não se queixava da massa, arroz, feijão e carne dos almoços e dos jantares na cadeia mesmo sendo um menu muito diferente dos jantares sofisticados que oferecia à elite política do Brasil em troca de favores em concessões. Numa dessas recepções, por sugestão de Lula da Silva, precisou mesmo convidar uma sindicalista ligada ao PT para irritação da mulher. “Espero que não me suje a toalha de linho…”, escreveu Isabela Odebrecht ao marido numa mensagem.
Longe vão os tempos também das festas luxuosas do ex-dono da maior empresa de processamento de carnes do mundo Joesley Batista nas mansões nos Jardins e em Angra dos Reis, no apartamento de Manhattan ou a bordo do iate estacionado em Saint Barth, nas Caraíbas. A sua festa de casamento com uma jornalista da emissora Band teve orçamento de dois milhões de euros, presença de Michel Temer e Lula entre outras autoridades cujas campanhas eleitorais, sabe-se hoje, patrocinava. A cada senhora convidada, de lembrança, foi atirada, qual bouquet de noiva, uma mala Louis Vuitton. Agora, Joesley e o seu irmão Wesley, cada um com fortuna estimada em 1 bilhão de euros, partilham cela numa cadeia de Brasília abastecida apenas por cano de água fria.
O banqueiro André Esteves, do Banco Pactual, comprou um avião por 65 milhões de euros, com autonomia para viajar de São Paulo a Lisboa e equipado, entre outros luxos, com chuveiros. O 13º brasileiro mais rico em 2015, com 2,5 bilhões de euros de fortuna, passou dias sem direito a banho numa cela individual infestada de ratos por estar ao lado de um esgoto, segundo reportagem da agência norte-americana Bloomberg, após acusação de obstrução de justiça, ao tentar comprar a fuga de uma testemunha.
Esteves, hoje em prisão domiciliária, foi obrigado a raspar o cabelo, assim como o empresário Eike Batista, fotografado pela primeira vez em público sem o seu dispendioso implante capilar italiano. Eleito cinco anos seguidos o homem mais rico do Brasil e sétima fortuna mundial em 2012, com cerca de 25 bilhões de euros, Eike passou pela Penitenciária Ary Franco, considerada a pior prisão do Rio, com celas subterrâneas povoadas de baratas e morcegos, sem vasos sanitários e sobrelotação de 220%.
Com dezenas de lanchas e carros de luxo na sua coleção, o empresário que abasteceu a cleptocracia de Sérgio Cabral, ex-governador do Rio entretanto condenado a mais de 60 anos de prisão, decorava o salão principal da sua mansão de seis milhões de euros com um Porsche e um Lamborghini estacionados entre os sofás – bólides que, entretanto, teve de vender para pagar a fiança e gozar prisão domiciliária.
Geddel Vieira Lima, o ex-ministro de Michel Temer, preso por obstrução à justiça e mais um punhado de crimes não é um empresário multimilionário como os anteriores. Mas, depois de num seu apartamento terem sido descobertos 51 milhões de reais [perto de 14 milhões de euros], na maior apreensão em dinheiro vivo da história do Brasil, merece uma menção como um dos políticos que mais enriqueceu através de verbas públicas.
Segundo a polícia, chora a cada depoimento, implora aos advogados para ser transferido da cela que partilha com mais nove detidos para o hospital da cadeia e entrou com requerimento, entretanto recusado por uma juíza, para cumprir a pena no domicílio por temer ser vítima de violação dos colegas prisioneiros.
Logo Geddel que era acusado no auge da carreira, vivido imediatamente antes da prisão, de ser prepotente – como no caso em que instruiu o Ministro da Cultura de Temer a deixa-lo construir um prédio num local tombado por razões históricas em Salvador. E desafiador, por, via Twitter, responder a provocações de eleitores com expressões como “a cachorra da sua mãe”, “sua mãe me quer o tempo todo” e “onde é que eu estava? Me aquecendo com sua mãe”.