“Por favor, não reproduzam esse discurso baixo, moralista e despolitizado de “respeito a vida”. Vocês estão garantindo que vida para essas crianças nascendo?“
Por THATI NICACIO
Twitter 22/02/2022
Recebi uma imagem onde uma estrela do PT e a logo do comunismo estão matando um bebê. Eu gostaria MUITO que vocês ouvissem o que uma mulher de periferia, criada dentro do evangelho (sim, formada pela assembleia de Deus), tem a dizer sobre isso.
Sempre achei um absurdo ver pessoas falando sobre o aborto. Grávida aos 15 anos e criando meu filho, meu discurso sempre foi a distorção utópica do “direito a vida” que aprendi na igreja. Esse sensacionalismo ideológico é típico da religião nos distância da realidade.
Em 2012 eu tive um aborto espontâneo, fruto de uma relação cheia de violências e humilhações cotidianas que duraram cerca de 2 anos. Um deslocamento do saco gestacional e várias agressões psicológicas levaram o possível 2° filho embora.
No hospital, uma moça que provocou o aborto estava ao meu lado. O tratamento desumano que essa mulher recebeu acabou comigo e eu saí refletindo sobre as violências que as mulheres sofrem. O Estado garante o nascimento, mas não garante absolutamente mais nada para a criança.
A mulher ao meu lado era mãe de 5, não conseguiu laqueadura pelo SUS e era constantemente violentada e estuprada por seu companheiro. Decidiu, sozinha, que não permitiria que nenhuma outra criança nascesse do seu ventre, porque a fome que os filhos passavam era muito sofrimento.
Eu não saí a mesma pessoa dessa experiência. Quem somos nós para definir o que uma mulher pode fazer com seu corpo? Porque o Estado brasileiro é regido por concepções ideológicas se, teoricamente, somos laicos? A minha fé não pode ser as correntes de alguém.
Até porque fere a lógica do livre arbítrio defendida pela igreja. Cada pessoa “pagará” por seus pecados de forma INDIVIDUAL. A pauta moralista é tão absurda que dói. Dói na gente que é mãe e sabe as dificuldades sociais que se enfrenta com a maternidade, que não é nada glamourosa.
A maioria das famílias monoparentais são formadas por MULHERES (quase 98%). Qual a garantia de desenvolvimento, alimentação, saúde, educação e cuidados que são garantidos pelo Estado? Como essas mulheres trabalham sem deixar o filho em uma creche, sem ser no mercado informal?
Um filho não pode ser um “castigo” ou uma obrigatoriedade. Criar uma pessoa é uma questão de escolha, em conjunto com condições estruturais para formação desse ser. O que vocês querem? Aumento de órfãos e crianças em situação de rua? Crianças com fome, aumento da miséria?
Por favor, não reproduzam esse discurso baixo, moralista e despolitizado de “respeito a vida”. Vocês estão garantindo que vida para essas crianças nascendo?