O PT existe na Espanha, Uruguai, Costa Rica, Argentina, México, Panamá, Peru, Reino Unido…

Rudá Ricci mostra a “contribuição inquestionável à democracia” do “maior partido brasileiro, que chegou 7 vezes ao segundo turno das eleições presidenciais desde o fim do regime militar, ganhando duas

O sociólogo Rudá Ricci produziu no Twitter uma thread mostrando a “contribuição inquestionável à democracia brasileira” do Partido dos Trabalhadores“maior partido brasileiro, que chegou 7 vezes ao segundo turno das eleições presidenciais desde o fim do regime militar, ganhando duas“.

Após o 43º aniversário da legenda no último dia 10/2, Ricci analisa as mudanças no ideário e prática petistas nessas 4 décadas:

Leia a seguir:

O PT nasceu em 1979. A sigla tinha sido definida como política dos trotskistas das diversas edições da 4ª Internacional. Um encontro dessas correntes criou o PT por aqui, mas logo se deram conta que faltavam justamente os líderes das greves metalúrgicas. Deram um passo atrás.

PT existe na Espanha (1979), Uruguai (1984), Costa Rica. Temos Partido Socialista dos Trabalhadores na Argentina, todos trotskistas. A sigla está no México (1975), Panamá (1983, de inspiração trotskista), Peru, Reino Unido.

O PT criado em 1980 nasceu como um freio de arrumação na iniciativa de 1979 e, logo se descobriu o jeito metalúrgico de fazer política. Num piscar de olhos, os trotskistas ficaram numa posição menor que a de sindicatos, movimentos sociais, católicos e ntelectuais.

Aliás, na foto clássica de fundação do PT num colégio paulista, Paulo Skromov aparece na mesa principal do evento. Skromov era trotskista e foi presidente do Sindicato dos Coureiros do Estado de São Paulo. Foi um dos organizadores do Movimento pelo PT de dezembro de 1979.

Skromov presidiu a plenária de fundação do PT no Colégio Sion, em 10 de fevereiro de 1980. Era trotsksista desde 1968 e fez parte da Organização de Mobilização Operária (OMO) e a Organização Marxista Brasileira (OMB).

A concepção inicial do PT passa por uma primeira fase, de 1980 a 1983. No primeiro momento, articulou forte vertente basista e anti-institucional baseada na Teologia da Libertação, embora o sindicalismo “autêntico” (que daria origem à CUT) tivesse influência de marxistas.

Em 1982, o PT participou de sua primeira campanha eleitoral com campanha nitidamente classista. Os candidatos apareciam como militantes de esquerda, muitos se diziam ex-guerrilheiros ou ex-presos políticos. Lula, candidato ao governo paulista, fez 10% dos votos.

É no bojo do baque que as eleições de 1982 causaram no PT que surge o famoso “Manifesto dos 113”. O número se deve às assinaturas que subscreveram este documento. O Manifesto logo se torna um divisor de águas no partido. Vou reproduzir algumas passagens.

O Manifesto começa afirmando que “defendemos o PT como partido de massas, de lutas e democrático. Combatemos, por isso, as posições que, por um lado, tentam diluí-lo numa frente oposicionista liberal, como o PMDB”.

Prossegue e critica a “ação predominantemente parlamentar-institucional”, algo que criaria uma cisão interna nas direções petistas atuais. Segue se opondo aos que “se deixam seduzir por uma proposta socialista sem trabalhadores, como o PDT”;

Continua: “Também combatemos aqueles que (…) se encerram numa proposta de partido vanguardista tradicional”. O PT se definia como socialista, antissoviético e antipopulista. É de se estranhar que, hoje, neopetistas citem a experiência soviética como alinhada ao PT.

Em 1989, a candidatura de Lula foi para o 2o turno, disputando com Collor e, por pouco, não vence a eleição. Eu participei como coordenador da elaboração do programa agrário e posso atestar que sabíamos que a vitória seria ameaçada pela extrema-direita.

Passadas as eleições de 89, o debate interno na corrente majoritária – a Articulação – apontava para o PT se preparar para ganhar as eleições como possibilidade concreta. Significava ampliar as alianças, abrandar o marco socialista e se aproximar do alto empresariado.

As campanhas de 1994, 1998 e 2002 seguiram este marco de alteração significativa do ideário original do PT. Mas, o que mudou de mais importante a partir de 1994? Vou listar 4 mudanças que consideram mais radicais.

A primeira mudança foi a relação com movimentos sociais. A relação original era umbilical. Não era de mera escuta, mas de alinhamento. A partir de 1994, a relação passou a ser de, no máximo, consulta.

Outra mudança foi no processo de tomada de decisão do partido. Antes, a base mandava. Os famosos núcleos de base do PT tinham mais poder que parlamentares petistas. Eu mesmo vivenciei este poder durante a Constituinte e quando fui coordenador de sub-região em SP.

A partir de 1994, as decisões passaram a ser mais centralizadas. Os militantes e intelectuais do partido perderam força e os dirigentes da corrente majoritária e marqueteiros passaram a dominar o cenário.

Dessa mudança decorreu o institucionalismo. Se havia rejeição ao campo institucional nos primeiros 15 anos do PT, a partir da segunda metade dos anos 1990, o campo institucional passou a ser prioritário, alinhado à meta de vencer eleições. Vejam que uma mudança leva à outra.

Finalmente, o ideário e o programa do partido. De socialista o PT passou a adotar um viés socialdemocrata. Depois, eliminou a palavra “socialista” de seu discurso e, finalmente, já no século XXI, caiu de boca no ideário social-liberal, afeto aos interesses do mercado.

O lulismo passou a ser a marca desta mudança. Para além da figura de Lula, é uma concepção de Estado e de política que adota o referencial do parlamentarismo como eixo. Outra inspiração evidente é o rooseveltianismo, aquela concepção de alavancou o New Deal.

A concepção social-liberal do lulismo preserva o mercado. O alto empresariado, ao contrário, flerta com o ultraliberalismo que desagrega a sociedade. O lulismo não gera risco algum ao mercado financeiro.

O PT é o maior partido brasileiro, o que chegou 7 vezes ao segundo turno das eleições presidenciais desde o fim do regime militar, ganhando duas. É o partido que mantém sempre uma das principais bancadas federais e o que efetivamente dita a agenda nacional.

No ano passado, o Datafolha revelou que o PT é o partido preferido de 28% dos brasileiros entre os 3.666 ouvidos em 191 cidades entre os dias 13 e 16 de dezembro.

Não dá para comparar com nenhum outro partido brasileiro. Sua importância é incontestável. Porém, não se trata mais de um partido de esquerda. A questão posta não é o da legitimidade e importância do PT, mas que apito ele efetivamente apita no século XXI”.

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