Agora vai? Ministros brasileiros se aliam a Tedros em detrimento de Bolsonaro

Marcelo Queiroga e Carlos Alberto França, da Saúde e das Relações Exteriores respectivamente, dão sinais de que uma reedição do governo está sendo rascunhada, desde que o ex-presidente Lula passou a representar uma ameaça à reeleição do presidente do Brasil

Uma reedição do governo pode ter sido iniciada. Efeito Lula? Desde que o ex-presidente recuperou seus direitos no TSE e passou a crescer politicamente tendo, inclusive, já ultrapassado Bolsonaro nas pesquisas, tudo está diferente. E é possível sentir essa mudança na atuação de dois novos ministros: Marcelo Queiroga e Carlos Alberto Franco França, da Saúde e das Relações exteriores, respectivamente. Ambos dão sinais de alinhamento à OMS.

No caso do ministro da Saúde, e segundo Tedros Adhanom Ghebreyesus – diretor-geral da Organização Mundial da Saúde -, ele fez um “relato alarmante” sobre a pandemia no Brasil e se comprometeu em manter encontros assíduos, com ele e especialistas do mundo. E no caso do novo chanceler de Bolsonaro, seu discurso de posse, na manhã desta terça-feira, pode ser entendido como uma mensagem de que presidentes passam, mas as relações internacionais ficam.

Ao responder pergunta sobre que conselho havia dado ao ministro da Saúde do Brasil, Marcelo Queiroga, durante conversa ocorrida no sábado (3), em que foi relatada uma “situação alarmante” da pandemia de Covid-19, Tedros fez a seguinte declaração, nesta terça-feira (6):

“Começamos por como a situação é séria no Brasil, ele começou por descrever a situação, que é realmente alarmante”.

O diretor da OMS afirmou que ele e Marcelo Queiroga combinaram de manter contato constante e promover reuniões entre especialistas em vários níveis de combate ao coronavírus, conforme foi publicado na Folha de S. Paulo.

A atuação do novo ministro da Saúde dá uma virada radical por defender a contratação técnicos no ministério e por apoiar publicamente o distanciamento físico e o uso de máscaras para evitar o contágio, apesar da oposição às medidas feita pelo presidente Jair Bolsonaro.

No ano passado, Bolsonaro atacou o diretor da OMS, dizendo que não pretendia seguir suas recomendações pelo fato de ele não ser médico. Em 12 de março, Tedros elevou o tom e disse que o quadro da pandemia no Brasil era extremamente preocupante e colocava em risco também países vizinhos:

“Começando pelo governo, todos no Brasil precisam levar a pademia a sério. Estou profundamente preocupado com o aumento nas mortes. Não haverá redução significativa no contágio sem medidas sociais sérias, é preciso que haja mensagem clara das autoridades sobre a gravidade da situação e a necessidade das restrições, e o governo precisa fazer cumprir as medidas”, disse o diretor-geral da OMS, na ocasião.

Essa reaproximação com a OMS revela uma significativa mudança de direção. E neste sentido, o discurso de Carlos França hoje também mostra que Bolsonaro pode estar sendo redesenhado.

Em seu texto de hoje, o diplomata iniciou afirmando que “o momento é de urgências” e sublinhou três prioridades: “a urgência no campo da saúde, a urgência da economia e a urgência do desenvolvimento sustentável”. França prometeu o engajamento de “Missões diplomáticas e Consulados do Brasil no exterior” no que ele chamou de “diplomacia da saúde” que ocorrerão “em diferentes partes do mundo” visando “contatos com governos e laboratórios para mapear as vacinas disponíveis”.

Ao contrário de seu antecessor, Ernesto Araújo, França quer “abrir novos caminhos de atuação diplomática, sem preferências desta ou daquela natureza”.

O texto do discurso do novo chanceler descaracteriza o que se viu até aqui, no governo Bolsonaro.

Ele aponta como segunda urgência a economia, e promete pautar negociações comerciais internacionais: “Nossa política externa tem um sentido universalista”.

França também aponta como a terceira urgência o clima: “É urgência em outra escala de tempo – mas é urgência”. O chanceler afirmou que “temos a mostrar, ainda, uma legislação ambiental – o Código Florestal – que é das mais rigorosas do mundo. Ou uma Contribuição Nacionalmente Determinada, ao amparo do Acordo de Paris”.

O chanceler contrasta com Bolsonaro ao valorizar a ciência, como se dissesse que o potencial do Brasil de hoje não é mérito do presidente atual: “Quarenta anos de investimentos em ciência nos permitiram produzir mais com relativamente menos terra e com melhor uso do solo. Quem importa alimentos do Brasil, Presidente Bolsonaro, importa tecnologia”.

O discurso de França mais parecia ter sido produzido para convencer Bolsonaro de que uma mudança deveria ser feita dentro de sua mentalidade, essa que todo o povo brasileiro conhece muito bem e se choca quase que diariamente. Por várias vezes o novo chanceler se referiu ao presidente, citando seu nome, como se para chamar sua atenção de que seu método divergirá do bolsonarismo. Como, por exemplo, nos trechos sequenciais de seu discurso, conforme abaixo:

“Senhor Presidente, Não será suficiente dialogar com outros países. Esse é o mínimo, é a alma do nosso negócio”.

“O diálogo é essencial na resposta a todas essas urgências: a sanitária, a econômica e a ambiental. O Brasil sempre foi ator relevante no amplo espaço do diálogo multilateral. (…) continuaremos a apostar no diálogo como método diplomático”.

“Outro lugar onde o diálogo se impõe é a nossa vizinhança”, afirmou ao se referir à Argentina. “O Mercosul, que também completa três décadas, representa uma etapa construtiva da integração com nossos vizinhos. E é preciso ir além, abrindo novas oportunidades. (…) Foi assim que aprendi, no Itamaraty, a entender o ofício do diplomata: um construtor de pontes”.

(…) é nesse espírito que assumo as funções com que Vossa Excelência me distinguiu, Presidente Jair Bolsonaro.

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